Caminhos para uma comunicação organizacional relevante
Há um momento em que a comunicação deixa de ser apenas sobre palavras e imagem e começa a ser sobre escuta e observação. Sobre fazer uma proposta de algo que possa tocar de alguma forma quem a abre. É sobre deixarmos de planear tendo em vista meros destinatários ou audiências, para pensarmos tendo em vista uma comunidade que se enriquece, alimenta ou desafia a partir das perspetivas que os conteúdos de comunicação lhes propõe.
Para mim, este é o ponto de partida da comunicação das organizações sociais. E é nesse território para lá do espetáculo e das tentências comerciais — entre o cuidado e o compromisso — que temos procurado no IPAV e nos seus projetos.
Ao longo dos últimos anos, temos confirmado que a comunicação, sobretudo no setor social, só faz sentido se for intencional, acessível, multidisciplinar e gesto de serviço. E por isso, aqui vão as pistas para os nossos caminhos.
Uma comunicação intencional parte de um propósito claro: não comunica por comunicar, mas para fortalecer a missão da organização, aproximar pessoas e comunidades, gerar impacto e mobilizar ação. Assenta num propósito alinhado com a missão da organização e não se perde em fórmulas vazias. Quando cada palavra conta, comunicar é tão estratégico quanto relacional.
Num setor onde os recursos são limitados e as necessidades são urgentes, cada mensagem deve contar — não há espaço para ruído. Ser intencional é, por isso, pensar porquê, para quem, quando e como se comunica. É rasgarmos algumas convenções comerciais de comunicação e construirmos um roteiro autêntico e coerente com a identidade da organização. É alinhar a linguagem com os valores, as plataformas com os públicos e o conteúdo com os objetivos. É uma abordagem que reconhece e valoriza o tempo e a atenção das pessoas que veem, leem, ouvem os conteúdos que preparamos; é estratégica, porque amplifica o trabalho feito no terreno; e é transformadora, porque abre caminho ao encontro, à relação.
Quando falamos de uma comunicação acessível não nos referimos apenas à necessidade de a comunicação ser compreendida por quem a recebe — comunicação acessível é também aquela que pode ser mantida e apropriada pela própria organização. Quando a comunicação depende de ferramentas complexas ou linguagens externas ao dia a dia da equipa, torna-se insustentável. Por isso, a acessibilidade é também uma questão de autonomia: garantir que a organização consegue dar continuidade à sua comunicação com os meios que tem.
Uma comunicação acessível respeita os recursos disponíveis, reforça a identidade e garante durabilidade — mesmo em contextos de limitação. Por isso, uma comunicação verdadeiramente acessível pensa também na capacidade da organização em continuar a comunicar quando o consultor sai, quando o financiamento termina, quando a equipa é reduzida ao essencial. É uma comunicação que simplifica em vez de impressionar, capacita em vez de substituir, propondo ferramentas ajustadas à realidade: simples, reaproveitáveis, alinhadas com os ritmos da organização.
Uma comunicação multidisciplinar, que reconhece que comunicar bem exige que cruzemos áreas e ferramentas. Vive em diálogo com a comunidade e com o desenvolvimento tecnológico e digital, pensa estrategicamente, cria com estética e sensibilidade. É também saber tirar partido, de forma integrada e consciente, de tudo o que o desenvolvimento digital hoje oferece — das plataformas às linguagens visuais, das ferramentas colaborativas à análise de dados. Não se trata de usar tudo, mas de saber escolher e tirar o máximo partido da relação entre diferentes áreas de conhecimento.
Num tempo de excesso, comunicar menos e melhor é um gesto de cuidado: é escolher comunicar com intenção e relevância. No contexto das organizações sociais, comunicar é serviço se colocarmos a comunidade e as pessoas no centro. Este serviço é também estratégico: evita a dispersão de esforços, foca a equipa no que realmente importa e cria conteúdos que têm continuidade — que podem ser reutilizados, adaptados, integrados em diferentes momentos e plataformas. Não se trata de comunicar por comunicar, mas de fazer com que cada gesto comunicativo contribua para o impacto real e positivo da organização.
Comunicar é um exercício contínuo de tradução da realidade em imagens e palavras, de mediação entre mundos, o que implica a escuta ativa de quem servimos. É um percurso que acompanha o trabalho real da organização, que o reforça, o torna visível, o liga a outras pessoas e contextos. Abrimo-la à colaboração, à dúvida, à revisão. É um caminho porque está sempre em movimento — porque depende do tempo, das relações, dos ritmos internos e das transformações externas. Quando a vemos como caminho, cuidamo-la com mais verdade e menos vaidade.
E por isto, acreditamos sobretudo que a comunicação não é um objetivo, mas um caminho — não é um fim em si mesma, mas uma ferramenta viva, relacional e em constante construção. Quando tratamos a comunicação como um destino, corremos o risco de a ver apenas como um produto final: uma publicação, um post, uma campanha bonita. Algo que se entrega e se esquece. A comunicação — sobretudo no setor social — não se esgota nos resultados. Ela acontece no processo: quando escutamos, quando reformulamos, quando abrimos espaço para novas vozes, quando construímos linguagem partilhada.
Autor: Pedro Amaro Santos | Diretor Comunicação IPAV